Seja a perda de um amor, de um trabalho, da saúde
ou da autoestima, o fato é que às vezes nos encontramos diante da dor
inexorável de quem perdeu. E esse sentimento pode nos afetar profundamente. A
sabedoria, porém, está em saber que há diferentes maneiras de viver e reagir
diante da perda, e ao doloroso período que a segue.
Reação à perda
Muitas vezes as perdas causam um sofrimento não
proporcional a seu tamanho: uma perda boba pode nos chacoalhar sem dó nem
piedade, enquanto podemos passar batidos por algo que deveria nos derrubar no
chão. Isto é, elas também dependem de nós. "A reação àquilo que perdemos
está sujeita ao histórico anterior da cada um", diz o neuropsiquiatra
francês Boris Cyrulnik ao analisar o sofrimento gerado por traumas e choques.
Ele também diz que as pessoas que reagem bem às pequenas perdas (com um
alto índice de resiliência, ou capacidade de voltar a seu estado normal) são as
que mais bem se recuperam diante de um caso mais grave. Portanto, procurar
elaborar as perdas menores do cotidiano pode nos preparar para acontecimentos
mais difíceis.
Colocando para foraFalar sobre a própria dor, desabafar, é muito importante. "É o começo da recuperação", afirma Cyrulnik. "Verbalizar torna a pessoa mais consciente do que aconteceu. Nesse processo, ela pode compreender melhor a situação e ultrapassá-la".
Nesse momento, porém, podemos entrar em contato com uma raiva que escondemos até de nós mesmos. "Quando uma pessoa perde um companheiro de muitos anos, por exemplo, ela pode se sentir abandonada - e com raiva de quem partiu". afirma a psicóloga junguiana Mônica Giacomini. Essa raiva, não manifestada, passa então para o inconsciente. "Enquanto não a elaborarmos, torna-se difícil iniciar um processo de recuperação", diz Mônica.
E o período de luto não acontece só por uma pessoa que morreu, mas também por uma relação amorosa que acabou, por uma demissão que gerou uma sensação de incapacidade e outras situações. "A perda da autoimagem e do amor, por exemplo, é capaz de gerar um luto tão intenso quanto a morte", diz Mônica. "Enquanto rejeitar a si mesmo e o que aconteceu, a pessoa vai projetar essa mesma rejeição nos outros. Para ela, ninguém será capaz de aceitar algo que ela mesma tem dificuldade de assimilar", diz Mônica. A recuperação inclui utilizar recursos criativos que permitam assimilar a dor e desenvolver maneiras de superá-la.
A libertação
"As perdas mais comuns pertencem ao universo do ter, àquilo que eu penso que é meu: pessoas, inclusive", diz o médico homeopata Adair Zan. Esse sentimento pode se tornar muito possessivo e gerar um enorme sofrimento. "Não é sábio marcar a vida, ou o amor, em territórios delimitados. É uma ilusão pensar que somos capazes de mantê-los a qualquer custo".
Ele também lembra que a noção de que o destino foi injusto pode agravar a sensação de dor. É o caso, digamos, da traição ou de uma demissão arbitrária. "A diferença é que, no exemplo corporativo, a assimilação é mais fácil. O funcionário é que foi demitido, não a pessoa. Já na traição, a dor é pessoal, carregada de peso cultural", afirma Zan.
O médico acredita que, por meio de uma reflexão verdadeira, é possível chegar a um novo equilíbrio. Enxergar sua responsabilidade num processo de separação também é curativo. "O ideal é que o namorado ou o cônjuge pudesse um dia sentar e conversar com o ex-parceiro sobre isso, para chegar às verdadeiras causas do rompimento. Como é bem difícil isso acontecer, podemos traçar esse caminho com a ajuda de um terapeuta", avalia.
Pausa para o recomeço
Quando uma situação ou um ciclo acaba, é preciso reconhecer que algo mudou e que a vida não será a mesma. "Precisamos de um tempo para voltar a pulsar de maneira plena, com energia suficiente para fazer frutificar novas ideias ou formas de se relacionar. Quando deixamos um ciclo de fato se encerrar, sem pressa, conseguimos voltar à vida mais íntegros", afirma a psicoterapeuta Sandra Taiar.
Ao conseguir empreender essa tarefa, estaremos prontos para superar a dor e juntar forças a fim de encarar as inevitáveis mudanças geradas pela perda. Nesse ponto de reconciliação com a vida, os danos gerados por ela já serão mais administráveis. E a compreensão de que há uma maneira mais sábia de passar pelo sofrimento pode nos ajudar muito.
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